“PÁ! Primeira sensação é isso. Parecia um PÁÁÁ. Não sei como definir”. Esse é o Gabriel Comicholi, de 23 anos, ator e youtuber, contando, online, como recebeu a notícia de que vivia com HIV. Logo depois, achou que ia morrer. Mas em pouco tempo, conseguiu processar de forma mais positiva o diagnóstico e transformá-lo em combustível para se expressar e disseminar informações em um canal no YouTube. A descoberta ocorreu no início de 2016, depois de um exame de rotina.
Num belo dia, Gabriel acordou com uma “bola no pescoço”, como ele descreve, e foi ao médico. A suspeita inicial era de uma prosaica caxumba, mas o especialista aproveitou sua ida ao consultório para pedir uma batelada de exames, entre eles o de HIV. Todos os resultados saíram, menos o do HIV. Gabriel recebeu então um telefonema do laboratório, informando que o teste tinha dado positivo e que seria preciso repeti-lo. O novo teste confirmou o diagnóstico.
Mesmo sem entender direito o que estava acontecendo, Gabriel foi para a frente do celular e gravou um vídeo de quase dez minutos (que seria o primeiro do seu canal no YouTube) falando sobre o diagnóstico e sobre o que estava sentindo. Ele também tratou de fazer um Skype com a mãe, que estava em Curitiba, enquanto ele vivia sozinho no Rio, e ela, imediatamente, mandou uma passagem para ele voltar para a sua cidade natal.
“Eu não esperava (o diagnóstico), nem imaginava, não sabia nem o que era direito”, admite ele. “Tinha uma ideia bem distante, bem distante mesmo; sabia que em alguma época pessoas morreram disso e ponto.” O primeiro contato com a família acabou sendo mais triste. “Acho que foi pior para a minha família do que para mim. Minha mãe chorou, teve todo aquele lance de achar que eu ia morrer no dia seguinte. Então, como era leigo, embarquei um pouco nessa onda ‘meu deus, estou com AIDS; meu deus, eu morro amanhã; meu deus, tenho tanta gente pra me despedir.’” Mas passado esse momento inicial, Gabriel começou a pesquisar sobre o vírus e a doença. “Na internet, percebi que havia muito material oficial, informação muito rebuscada, médica; no YouTube, então, não havia quase nada. Resolvi botar a minha cara nessa”, conta.
“Coloquei o vídeo que tinha feito na internet. E foi uma loucura. Foi quando o HIV entrou com tudo na minha vida...”
Da noite para o dia, o primeiro vídeo viralizou. E então Gabriel percebeu que era aquilo que deveria fazer. “Eu sempre fui muito dada, falar em público nunca foi um problema para mim. Já tinha vontade de mexer com internet, mas não sabia exatamente como, não tinha uma pauta. Mas aí a pauta surgiu. Paf! Então, eu falei, meu, é isso!”, conta ele. “Aí comecei a lidar com HIV, escutar histórias de outras pessoas, e comecei a mostrar o meu tratamento. Ia tomar remédio, filmava; tinha uma consulta com o médico, filmava. Fui fazendo uma espécie de vlog e as pessoas acompanhavam. Hoje procuro sentir um pouco a necessidade do público, o que eles pedem, ou se surge alguma coisa nova relacionada ao HIV.” Gabriel acredita que os novos canais, voltados para um público mais jovem, estão ajudando a divulgar informação sobre a infecção.
“As pessoas falam que a informação está aí para quem quiser”, analisa ele. “É verdade, mas eu acho que essa informação deveria chegar de forma orgânica, na televisão, na escola, que seria o ideal, e acho que é algo que passa muito batido. Eu não lembro de educação sexual na escola, não lembro mesmo, se duvidar nunca tive. Acho que por isso não tinha muito conhecimento do assunto. Hoje, com os canais, o meu e os de outros que estão aí no YouTube, acho que deu uma levantada.”
Gabriel diz que, apesar da exposição, nunca sofreu muito com preconceito. “Reconheço que tenho um local de privilégio, sou branco, de olhos claros, extrovertido, trabalho num meio em que as pessoas não têm muito preconceito”, explica. “Às vezes rola na internet, mas é ‘hater’, então nem coloco nessa categoria, nem levo muito em consideração.”
Tanto é assim que ele, que nunca tinha namorado sério, tem agora um parceiro. Gabriel conta que não houve problema de contar que era soropositivo. “Ele ‘peidou’, teve zero preconceito. O que ele não sabia, eu fui explicando, mas foi muito tranquilo”, diz. “Eu tô indetectável, então a gente se relaciona até sem camisinha porque mantemos uma relação monogâmica. De três em três meses, ele faz teste.” Avaliando a situação hoje, quase três anos depois do diagnóstico, Gabriel avalia que o HIV teve um efeito positivo na vida dele. “Eu me tornei uma pessoa melhor, mais humana”, diz ele.
Conheça mais o Gabriel: @gabrielcomicholi (Instagram) e HDiário (YouTube)