O desespero de saber que vivia com HIV foi tão grande que a primeira coisa que passou pela cabeça do publicitário Lucas Raniel, de 26 anos, ao receber o diagnóstico, foi se matar. Mas não foi apenas um pensamento. Ele, de fato, tentou se jogar na frente de um caminhão. E houve ainda mais uma tentativa de suicídio até que Lucas pudesse lidar, de forma positiva, com o resultado, transformando-o numa forma de ajudar outras pessoas e, ao mesmo tempo, de se ajudar a aceitar as circunstâncias e continuar vivendo. Foi um longo caminho.
“Sou soropositivo há cinco anos, desde 2013”, conta Lucas. “Contrai o vírus numa noitada mesmo, numa festa da faculdade, com muita droga, com muito álcool, em que fui encontrar com um cara que conheci pelo aplicativo.” Lucas foi parar na casa do “date”, onde continuou bebendo e usando drogas. “Apaguei”, lembra ele. “Tenho flashes de memória de ele me levar para o quarto, e de eu sentir uma dor muito forte mas não conseguir me defender porque não conseguia me mexer.”
Um tempo depois, Lucas estava com sífilis perianal, mas não tinha um diagnóstico correto. Durante mais de seis meses achou que tinha hemorroidas e usava tratamentos caseiros para esse problema, postergando a ida ao médico especialista. “Eu estava emagrecendo muito, tinha manchas vermelhas pelo corpo, dor de cabeça. Acabei indo ao médico, um proctologista, que me pediu todos os exames que eu nunca tinha feito na vida, entre eles o HIV.”
Diante apenas da menção ao exame de HIV, Lucas já “deu uma pirada” e começou a fazer pesquisas na internet. “Na minha cabeça, era tudo morte. Comecei a pesquisar os sintomas e batia muito com o que eu tinha, com o que eu estava sentindo.” No dia em que foi buscar o resultado, Lucas conta que o médico foi bem seco. Disse apenas que o resultado era positivo e que iria encaminhá-lo para um infectologista.
“Eu saí do consultório desesperado, e foi minha primeira tentativa de suicídio: tentei me jogar na frente de um caminhão”, lembra. “O consultório era numa ladeira, estava no telefone com a minha mãe, mas o caminhão estava vindo e eu queria acabar com tudo ali porque não ia ter muito tempo de vida.” A mãe de Lucas, mesmo por telefone, conseguiu acalmá-lo e demovê-lo da ideia. Na época, ele estava morando em Ribeirão Preto, no interior de São Paulo, e a mãe vivia em Colina, a 100 quilômetros de Ribeirão.
Mas o drama entre viver e morrer pautou a vida de Lucas por mais alguns anos...
O apoio do pai, que morava em Ribeirão, foi fundamental naquele primeiro momento. Após alguns meses, Lucas conseguiu se estabilizar emocionalmente. Começou o tratamento contra o HIV e, ao mesmo tempo, voltou a se encontrar com os amigos e a namorar. “Depois desse processo todo, comecei a entender que não era o fim de tudo, comecei o tratamento, melhorei autoestima, comecei a sair de novo, conhecer pessoas, ir para a balada”, conta. “Nesse processo todo, acabei contando para algumas pessoas que eu vivia com HIV.”
Lucas acabou sendo vítima de um bullying pesado e cruel. Ele conta que um grupo de Whatsapp foi criado na cidade, alertando para o “risco” de sair com “o sujeito soropositivo” que estaria disseminando propositalmente o HIV.
“É uma cidade pequena, com uma comunidade LGBT onde todo mundo conhece todo mundo. Meu rosto já estava marcado por conta dessa fofoca. Eu ia no bar LGBT e comecei a perceber os olhares. Então fui me fechando de novo, voltei para a depressão. Dessa vez, tive uma depressão profunda mesmo, e tentei o suicídio pela segunda vez.”
Lucas chegou a estar pendurado numa janela, no sétimo andar de um prédio, as pernas já completamente para fora do apartamento. “Quando olhei para trás, meu celular estava vibrando, era a minha mãe me ligando. Mais uma vez ela aparecia na minha vida no momento certo.” Lucas, afinal, voltou para casa da mãe, pediu licença no trabalho e começou um tratamento psiquiátrico.
Três meses depois, sentiu-se forte o suficiente para voltar para Ribeirão Preto. Nessa mudança, fez um post público nas redes sociais. “Migrei para o Instagram, comecei a falar disso com a galera, criei um canal no YouTube. Converso com as pessoas, respondo, ajudo. Já consegui salvar algumas pessoas que estavam à beira do suicídio também, que estavam prontas para se matar.”
Conheça mais o Lucas Raniel e seu trabalho: @lucasraniel_ (Instagram) e Projeto Boa Sorte (YouTube)