Quando recebeu o resultado positivo para o HIV, em 2009, o ator e bailarino Rafael Bolacha, de 34 anos, foi até a praia (ele estava morando no Rio de Janeiro na época). Era noite, mas ele sentou na areia e chorou. “Sentei lá e chorei tudo o que tinha para chorar”, contou ele.
Naquele momento, ele pensou nas coisas que ele (achava na época) não poderia mais fazer, como ser pai ou continuar vivendo de seu trabalho como bailarino. Mas não passou por sua cabeça todas as coisas que conquistaria nos anos seguintes, como ter se transformado em um escritor, cineasta e ativista.
“Descobri (que estava vivendo com HIV) em 2009, por conta de uma diarreia”, conta Rafael. “Foi muito complicado. Naquela época, não se tinha muitas histórias, as referências eram antigas, foi difícil entender o que ia mudar na minha vida. Decidi parar alguns trabalhos, como ator e bailarino, e fui fazer uma faculdade de produção e política cultural no Rio. Foram três anos de faculdade.”
Na época, Rafael começou a escrever um blog, que chamou de Uma Vida Positiva. “Escrevendo, pude quebrar meus preconceitos, me entender, entender o que mudava na minha vida ou não, entender a rotina da medicação”, lembra. “Foi quando comecei a trocar informações com outras pessoas, familiares e gente que me mandava e-mails; vi que tínhamos uma carência enorme de pessoas abordando o tema. Então me lembro de ter pensado: poxa, se eu consigo ajudar pessoas assim, se eu colocar a minha cara, vou poder ajudar muito mais.”
Rafael decidiu, então, lançar um livro, com base nos próprios relatos feitos no blog. O livro, que recebeu o mesmo nome do blog, foi lançado no Dia Mundial contra a AIDS (1० de dezembro) de 2012. O lançamento rendeu uma longa entrevista ao jornal O Globo, com direito a uma chamada na primeira página.
“Era o meu nome e a minha cara na capa do jornal”, relembra. “Lembro que chorava, chorava, chorava. E quando as pessoas me perguntavam por que eu estava chorando, eu respondia: porque agora todo mundo sabe que eu vivo com HIV. Mas isso era bom ou ruim? Isso dava uma agonia enorme de pensar que iam relacionar o HIV comigo. Ao mesmo tempo, era uma liberdade sem tamanho poder ser quem eu era a partir daquele momento.”
O livro e a visibilidade como pessoa vivendo com HIV foram só o ponto de partida para vários projetos...
“Nos meses seguintes ao lançamento do livro, fiz outros programas, me chamaram para palestras”, conta Rafael. “Minha formação de ator e comunicador me favoreceu ao falar do tema, tanto para jovens, quanto para professores e até empresários. Foi quando surgiu de fato o projeto Uma Vida Positiva.”
Em 2014, foi montado um espetáculo de dança contemporânea baseado no livro. Em 2017, foi filmado um curta-metragem sobre o dia em que Rafael descobriu que vivia com HIV. Na Columbia University, em Nova York, trechos de seu livro estão sendo usados em sala de aula. “São várias formas diferentes de abordar o tema. Formas diferentes de dar início ao diálogo, que é o que eu realmente gosto de fazer, conversar com as pessoas.”
Para o ano que vem, quando se completam dez anos do diagnóstico, Rafael planeja lançar um novo livro, contando todas essas novas experiências. “Não sou a mesma pessoa de dez anos atrás, então o primeiro livro está datado, é um diário. Quero agora entender essas mudanças de pensamento”, conta ele. “Demorei para aceitar o termo corajoso que as pessoas usavam para falar de mim. Mas agora sei quem eu sou, não vou mais me esconder.”
Conheça mais o Rafael: @rafaelbolacha (Instagram) e Chá dos 5 (YouTube)